Sobre maternidade, impeachment e o que vi neste tempo

Ao longo de todo este processo de impeachment, que também pode ser chamado de golpe, vi muita coisa ser dita e feita nas redes sociais, nas mídias como um todo e na vida real. A Internet foi o lugar do qual manifestei minha opinião, mais que isso, minha indignação diante deste processo, pois como muitos sabem tornei-me mãe recentemente e, em lugar de ir para rua manifestar-me, protestei pela Internet, tido por muitos como um lugar de comodidade, mas não pensem que é fácil postar uma mensagem com uma mão, enquanto segura o filho com a outra para que ele mame, pule e brinque com as cachorras. Daí muitos irão questionar por que eu não fiquei cuidando só do meu filho, afinal, como muitos ainda pensam, nascemos para isso mesmo. E então eu respondo: porque sou mulher, historiadora, professora, mãe, trabalhadora, escritora e cidadã brasileira (ou pelo menos tento ser tudo isso ao mesmo tempo) e tenho direito e obrigação neste atual momento da política brasileira de me posicionar.
Este processo de impeachment instaurado serviu, entre outras coisas, para mostrar que o PT errou ao se aliar ao PMDB e que agora paga o preço; que o Legislativo é composto de políticos preconceituosos, de pensamento retrógrado e conservador e que defendem família como pai, mãe e filho, que rezam em pleno plenário sendo o estado laico, que preferem diminuir a maioridade penal ao invés de investir em educação, que “lutam” contra corrupção sendo corruptos; que tenho mais amigos em redes sociais homofóbicos, machistas, racistas e acéfalos do que eu gostaria de ter; e que cuspir na cara de alguém é mais ofensivo do que fazer loas a um torturador. E vi tudo isso enquanto cozinhava a papinha do meu filho.
Mas eu vi coisas boas também, a partir do momento em que ocultei da minha linha de tempo todos aqueles amigos homofóbicos, machistas, racistas e acéfalos. Vi jovens protestando aqui, ali e acolá pelo seu direito a uma educação de qualidade, por uma escola que não sofra incêndios mensalmente, pela merenda que sacie o estudante que muitas vezes vai à escola também pela merenda, pelo direito a ter mais aulas do que pela redução do número delas; vi mulheres defendendo a presidenta Dilma quando discursos de misogia, proferidos muitas vezes e, infelizmente, por outras mulheres, desqualificavam aquela mulher, não pelo sua função, mas pelo fato de ser mulher; vi meus sobrinhos de 10 e 11 anos entenderem melhor o atual quadro político brasileiro do que muito adulto graduado; e vi mais pessoas mudando de opinião, colocando-se contra o golpe do que a seu favor. E vi tudo isso enquanto dava banho no meu filho.
Portanto, no histórico dia de hoje, no qual será fechado um importante ciclo de desenvolvimento do Brasil, é mais do que necessário fazer eco a todas aquelas expressões que foram bradadas nas ruas e nas redes sociais, pois em defesa da democracia e pelos 54 milhões de votos que legitimamente reelegeram a presidenta Dilma Roussef, digo que não vai ter golpe porque vai ter luta, os golpistas não passarão, pois a luta continua. E como já estou escrevendo com uma mão somente, pois a outra está segurando meu filho que pendurado na minha perna quer ir para o chão e andar, vou então guiá-lo nestes primeiros passos, segurando-o firme com as duas mãos.




Comentários

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  2. Alice, nossos olhares sobre o atual momento politico contém algumas diferenças, pontuais, diria eu, no entanto, temos importantes acordos, como por exemplo, a necessidade da luta, mas o mais importante, é que sua condição de mãe lhe acrescenta uma sensibilidade maior, pois o seu "mundo melhor" não é só um desejo, que fica no abstrato, sua vontade, sua preocupação com um mundo melhor no futuro, tem rosto, tem nome, tem fome... E a sacia diretamente no seu corpo.

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