"Tô me divertindo muito, caralho!"

Segundo o horóscopo do dia, Alice deveria “deixar o prazer fluir”. O que significava sair, encontrar os amigos, conhecer novas pessoas, conversar. Num primeiro momento ela ficou um pouco relutante, estava meio preguiçosa ultimamente, sem dinheiro também, mas surgiu um programa bem conveniente: um show ao ar livre e de graça, então resolveu aceitar o convite de Marcela e Carol.
Já passava de dez da noite quando Alice chegou ao local marcado. Ao descer do táxi, teve a impressão de que seria uma noite tranquila, viu pessoas vestidas de modo informal e já ouvia a música ao longe. Sentiu-se confiante. Ao se deslocar até o local combinado, Alice caminhava altiva, passos largos, cabelos ao vento, livre como há muito tempo não se sentia, percebia até uns olhares masculinos e femininos (talvez), até que o destino resolveu sacanear com sua cara. A primeira pessoa que encontrou foi Serginho, logo ele! Ela se assustou, há algum tempo não o via, e o susto foi tão grande que passou por ele como um furacão, só deu tempo para dois beijinhos e um “oi! Tudo bem?”. Continuou sua caminhada, agora um pouco pensativa. Mas pensou só um pouco, logo começou a falar com muitos conhecidos e deixou para avaliar o impacto de ter encontrado Serginho para depois.
Finalmente chegou até Marcela e Carol, que já aguardavam-na ansiosas. “Encontrei Serginho!” foi a primeira coisa que disse. “Oi para ti também”, falou Carol e Marcela ironizou: “Encontrei Serginho é uma nova forma de saudar os outros, é?!”. Alice riu, pediu desculpa, deu beijos e abraços e disse que se assustou com o encontro, mas que de alguma maneira foi melhor do que esperava. As amigas ficaram felizes por ela. Só não sabiam que o destino também as testaria.
Já passava das onze da noite e nada do show principal começar. Os produtores da festa resolveram testar a paciência de todos os presentes. Várias bandas se revezando no palco, de diferentes estilos, mas com uma coisa em comum: todas tocavam somente instrumentais, ou seja, sem vocal. Instrumental de brega, de funk, de rock, de jazz, e de samba. As amigas então resolveram dar uma volta, antes que fossem hipnotizadas pelos instrumentais. Mas antes tivessem sido hipnotizadas...
“Marcela, olha quem tá ali”, exclamou Alice. Marcela só fez encostar a testa no ombro de Alice e resmungou: “não acredito!”. Esse ato inocente foi interpretado por João, “ex” de Marcela, como: “não adianta se esconder! Não quer falar comigo, não?!”. Marcela pensou em responder de forma desaforada, mas o deixou pensar o que quisesse, deu dois beijinhos e passou por ele como um furacão. Pouca coisa foi dita entre as amigas, somente “não acredito!”, “não acredito!”. Continuaram passeando. (De teimosas que são, porque deveriam ficar paradas, o destino já tinha colocado as manguinhas de fora, agora ele ia colocar tudo para fora, o que não sei o que é, porque eu não entendo esse ditado).
E continuaram entoando “não acredito!”, “não acredito!” como se fosse um mantra. “Não acredito!”, exclamou Carol ainda mais alto, acabando de dar de cara com seu “ficante” com outra! E o ritual se repetiu: deu dois beijinhos e passou por ele como um furacão. O mantra ou qualquer tipo de comentário foi evitado, Carol olhou para as amigas e as três se acabaram de tanto rir. Não podiam fazer outra coisa senão rir. Resolveram voltar para o local de origem. Lá estariam protegidas (ou não), mas por via das dúvidas voltaram. Entretanto o retorno não foi totalmente feliz, pois deviam tomar todo cuidado com o “território inimigo”, pois esse passeio havia se tornado uma “missão suicida”.
Já era outro dia quando o show começou. Alice conhecia poucas músicas, Marcela e Carol sabiam quase todas e por alguns instantes elas se distraíram. O show não durou muito. Também pudera, as bandas de instrumentais roubaram mais da metade do tempo da noite! Alice não viu mais Serginho. Marcela andou por “território inimigo” e ainda avistou João. Carol participou de uma “missão suicida” e viu seu “ficante” aos beijos com a outra. Enquanto isso tudo acontecia, o cantor pedia “um pouco mais de paciência”.
Era quase três da manhã quando o show terminou. Alice se apoiava em Carol, que se apoiava em Marcela, que se apoiava em Alice. Faltavam palavras para descrever essa noite de testes para cardíaco, regada a variações de sensações e humores. Havia perto delas um grupo de homens inconvenientes e bêbados que azucrinavam todas as mulheres em um raio de cinco mil metros. Enquanto eles perturbavam a ordem pública, as amigas faziam um balanço da noite. Alice disse que foi um teste, mas que no final salvaram-se todas. Para Carol foi reflexiva, dali pra frente ela iria pensar bem no que fazer com os seus relacionamentos. Marcela achou aquilo tudo uma brincadeira; melhor, uma palhaçada; pra ser sincera, uma grande sacanagem. Um dos bêbados resolveu mexer com elas. Convidou Marcela para dançar, apontando o indicador em sua direção, dizendo “vem, vem”, enquanto remexia os quadris. Marcela sentiu vergonha só pelo convite e recusou. Ele não ligou. E ironicamente coube a ele a melhor descrição da noite: “Tô me divertindo muito, caralho!”. Acho que o nome dele era destino.

Comentários

  1. De fato, o destino resolveu sacanear com essas moças, e deve ter se divertido muito com a cara delas nessa noite rsrs

    ResponderExcluir
  2. Babi, isso é ficção, não é? Porque isso não acontece na vida real. Né, Luana? Rsss. Maira

    ResponderExcluir
  3. Ah, esse destino, pelo menos alguém se divertiu essa noite!
    Se bem-vinda de volta, Alice!

    ResponderExcluir
  4. Uau Alice!! Você já chega, chegando! A literatura combina com você. Bjs bjs,Dani.

    ResponderExcluir
  5. kkkkk, queria ser uma mosqueinha pra ver a cara de Alice e suas amigas nesse show de (des)encontros. Bem danadinho esse destino!
    Aline.

    ResponderExcluir
  6. é "mosquinha" ta gente, esse teclado!!!!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Autosabotagem

4 igrejas + 3 exposições = nossa própria tradição

Como vivem os idiotas ou até quando?